Humberto já não se lembrava de como era difícil caminhar descalço na terra. Os pés sofriam por pisar nas espigas esmagadas, como se o trigo quisesse num último estertor partilhar a sua frustração pelo abandono a que foi votado pelo Homem. E qualquer representante da raça serviria, mesmo um tipo armado caminhando ofegante envolto apenas por uma bata branca...
Os olhos do ex-inspector já se tinham habituado à noite e a casa abarracada já se via a algumas dezenas de metros. Era uma construção em declínio, com um alpendre e uma janela à esquerda da porta, iluminada no interior. Parecia-lhe difícil escancarar a porta e entrar a matar sem ferir Mário, por isso alguma solução teria de se arranjar para atrair o cabrão do Marques para o exterior.
"Porra, o Saul dava jeito...!", pensou Humberto enquanto massajava o peito quase inconscientemente. Sentia dor nas costas e nas articulações, mas só pensava em tirar o filho dali para fora e encher de chumbo o seu antigo camarada.
De repente, um vulto aparece no campo de visão. Uma silhueta feminina, proveniente do rio, caminha até à casa. "É mais baixa que a Vanda... quem será? Uma cúmplice?", pensou.
A voz feminina que passados alguns segundos ouviu rapidamente o esclareceu: "- Ó da casa?", chamou a rapariga, com voz jovial mas ligeiramente assustada. Porque ninguém respondeu do interior, a rapariga que parecia envergar botas e casaco oleado repetiu a pergunta, com tom de voz um pouco mais elevado.
"Pronto!, não me faltava mais nada... Uma capuchinho que se veio meter mesmo na boca do lobo!", praguejou Humberto.
E a porta da cabana abriu-se lentamente...
terça-feira, 1 de setembro de 2009
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