Os telefones negros estavam silenciosos, assistentes de uma conversa intrigante entre as paredes da esquadra de polícia de Vila Franca.
Dois bombeiros ainda em estado de estupefação pela forma inesperada como perderam um doente, dois inspectores da Polícia Judiciária que lançavam questões enigmáticas e um agente desorientado que tentava registar tudo num relatório...
- Mas diga-me, senhor Emanuel... Achou alguma coisa fora do normal no comportamento do paciente? Pareceu-lhe que ele estivesse a fingir? - perguntou Pinto, com o olhar cerrado.
- ... A fingir?? Mas se o homem teve um ataque cardíaco que o INEM esteve vai não vai para o declarar morto?! O inspector deve estar a brincar... - respondeu cheio de incredulidade o jovem bombeiro de tez negra.
- A brincar? A BRINCAR?? Mas você acha que a PJ não tem mais nada que fazer, para virmos aqui perder tempo convosco?? Nós estamos na peugada de um assassino muito perigoso, e parece-nos que o Humberto Sousa e a mulher que o libertou devem saber mais que nós desta porra toda! - respondeu Sequeira, dando um murro na mesa que levantou o teclado do agente.
Estavam todos perdidos, naquela sala. Até que o telefone negro tocou e os olhos se focaram no agente que respondeu ao chamamento do aparelho. Do outro lado uma voz falava ansiosa.
- ... Sim, sim, estou a perceber... Ah, e foi a que horas?... Hum, hum... Olhe, não mexa em nada que vou mandar já para aí um carro patrulha, ok? Não, não deixe ninguém entrar no local para não estragar a cena do crime, está bem?... O quê, é a única farmácia de serviço?... Olhe, não se preocupe com isso que nós vamos já para aí.
O agente de azul desligou o telefone. Levantou-se, foi até à sala contígua e passou a mensagem aos colegas que assistiam a um programa sobre bizarrias do mundo animal. Estes pediram aos seus corpos o favor de se mexerem, e saíram. O agente voltou a sentar-se no teclado para reiniciar a sua espinhosa tarefa.
Os inspectores retomaram as questões:
- Mas como era a mulher?
- Era uma quarentona, de cabelos grisalhos, com mais ou menos 1,70 mt.
- E que carro é que ela conduzia?
- Um Fiat Punto dos antigos, já dissémos...
- E dizem outra vez se for preciso, meu amigo.
-...
- E que tipo de arma é que ela vos apontou?
- Sei lá que tipo de arma era! Era uma pistola como as vossas, se calhar...
- E ela diss..
Interrompendo o interrogatório, um dos agentes que havia saído reentrava para confirmar com o relator a mensagem de há pouco.
- Ó Gouveia, tens mesmo a certeza que a única coisa que foi assaltada nesta farmácia foi uma caixa de Plavix?
- Sim, porquê?
- Nada, nada... é que os drogados não costumam roubar medicamentos para o coração...
- Ó Saraiva, a dona da farmácia disse que a assaltante não parecia janada. É a crise, pá.
- OK, estamos a sair.
A saída do agente que interrompeu não foi seguida do reinício do interrogatório. O agente Gouveia só se apercebeu disso alguns segundos depois, já os olhos dos interrogados e interrogadores tinham poisado sobre si.
- Passa-se alguma coisa? - perguntou Gouveia.
- Depende. - respondeu Pinto.
- Você acabou de receber uma chamada a dizer que uma mulher sem aspecto de agarrada roubou um medicamento para o coração numa farmácia?
- Sim, porquê?...
Os inspectores saíram da sala e ainda conseguiram apanhar boleia da viatura que já tinha ligado as luzes e iniciado a marcha. Os bombeiros olharam um para o outro e perguntaram ao agente se podiam voltar para a corporação.
domingo, 3 de maio de 2009
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